Abriu os olhos e pôde apenas observar a escuridão acima de
sua cabeça. Estava tonta, como se estivesse passado uma noite inteira
embriagada ou pior, mas não conseguia raciocinar o que vira direito.
Levanta, Bela Adormecida! — Dizia uma voz que ela já
conhecia. Anala cutucava seu ombro com bastante força que chegara até a doer.
Pare, está me machucando — Respondeu, tentando levantar-se,
mas estava visivelmente cansada. Fraca, pra ser mais específico.
Onde estamos? O que aconteceu? — Perguntou ao levantar-se.
Enxugou os olhos e pode ver algumas barras de ferro à sua frente. Ao redor, o
que parecia ser uma caverna, totalmente escura. Estava presa.
Capturaram-nos. Prometeram nos soltar, mas até agora nada! – Respondeu Anala, encostando-se na parede de
rochas. Cruzou os braços e continuou a falar, indignada com a situação que
estava — Se aquele foguinho acha que as coisas vão continuar desse jeito, está
muito enganado! Eu vou apagar aquela tocha na primeira oportunidade que tiver!
– Resmungava. A voz de sua companheira estava cada vez se tornando mais baixa,
o que era estranho. Não conseguia raciocinar direito e apenas viu tudo
escurecer novamente. Desmaiou.
Horas antes...
São flâmines! — Disse olhando assustada para Anala. Estava
incrédula, como se não bastasse ter visto uma fada ceifeira, agora via um dos
seres mais temidos pelas fadas – Não acredito que você precisou apelar para
tanto! — Disse observando o rapaz com um sorriso no rosto.
Esses a gente pode afirmar que possuem um fogo no rabo! — Disse Anala. Sarcástica como sempre. Sabia do perigo que corria, mas não podia
perder a oportunidade.
Não é hora para piadas — Respondeu Alpha com os olhos
trocando de direções.
Sua amiga está certa — Disse o rapaz, cercado por seu
exército de flâmines — Como eu prefiro uma briga justa, eu posso dar a vocês
uma vantagem de... — Parou para pensar por alguns segundos — Um ou dois minutos
antes de soltar todos eles em cima de vocês — Finalizou com seu sorriso charmoso acompanhado de um par de brilhos em seus olhos.
Não é uma má idéia até! — Disse Anala em tom baixo, estava
visivelmente em pânico com os seres que estavam em sua frente.
Não — Alpha se impôs — Não estamos aqui para brigar,
seja-lá-qual-for-o-seu-nome. Isso aqui é sério, nós precisamos falar com as
rainhas. É importante.
1 minuto e 38 segundos restando — Disse ele ignorando a
atitude de Alpha.
Nós precisamos ir! — Anala agora estava praticamente puxando
Alpha, que se mantia firme como uma pedra no local.
Eu vim aqui para falar com as fadas rainhas e é isso que vou
fazer. Se você quiser ir, então vá — Disse para a fada de tons azuis. Observou
o rapaz olhar para o céu como se estivesse contando o tempo e então deu mais
alguns passos a frente, encarando-o — Pode vir todo o seu exército de fogo, eu
sou a água. Eu não temo você – Respondeu firme. Quando olhou para trás, Anala
já estava longe, correndo para lugares que ela mesma desconhecia.
Eu achava você mais inteligente que a azulzinha... Erro meu — Disse com seu sorriso sarcástico no rosto — Ataquem! — E sentou-se para
observar a luta que iria iniciar.
Campo de proteção! — Alpha disse em voz alta. Colocou suas
mãos na terra quente e em sua volta apareceu um grande campo de força de água
que fluía lentamente. Os animais que estavam em posição de ataque esconderam seus
rostos medonhos com suas asas peludas e, em seguida, deram passos para trás,
assustados com a água. Liberaram suas asas e então se puseram em posição de
vôo. Alpha observou-os saírem do chão e sobrevoarem sobre sua cabeça, mais
precisamente, sobre a água que a protegia. Viu e pode sentir também, as rajadas
de fogo que saíam de suas terríveis bocas. Sabiam que assim, enfraqueceriam a
fada e estava funcionando.
Droga, Anala, onde você se meteu? — Pensou desesperada,
sabia que se Anala estivesse ao seu lado poderiam formar um campo mais
poderoso, que embora, só aumentaria o tempo delas ali e as enfraqueceria do
mesmo jeito.
Olhou para trás e viu uma luta começar. Estava nervosa e
queria fazer o caminho de volta, mas sabia que suas chances seriam mínimas. Encontrou
uma escadaria e viu que aquela era sua única opção antes dos flâmines
conseguirem localizá-la. Subiu os degraus da escada lentamente. Não queria
fazer muito barulho, pois poderia despertar outra criatura de fogo e isso
certamente não melhoraria a situação.
Droga! — Disse ao tropeçar em um dos degraus. Anala estava
tão nervosa que nem percebeu que gritou alto suficiente para alguém próximo
escutar. Parou por alguns segundos para sentir o local e percebeu que tudo
continuava do mesmo jeito. Respirou aliviada e seguiu o caminho.
Encontrou uma porta e como não teve opção entrou. Imediatamente
tampou o nariz, o cheiro daquele lugar era terrível comparado aos belos campos
em que ela frequentava. Era um cheiro mais pesado, como se tivesse ocorrido um
incêndio no passado e toda sua fumaça estivesse sendo mantida naquele lugar.
Sem contar a sensação de asfixiação que sentia. Parou para observar o local com
atenção e viu que era algo parecido com um santuário. Observou vários flâmines
em formas pequenas, de esculturas, ao lado do que pareciam ser dois tronos.
Certamente estava em um lugar que não deveria estar. Não teve muito tempo para
analisar o local, pois logo ouviu passos que seguiram de vozes.
— Faz isso, faz aquilo! Ah me poupe! Até parece que sou
empregada de alguém! — Entrou uma voz reclamando em voz alta. Anala não pode
ver quem era, pois estava tentando esconder-se, mas notou que era uma voz
feminina. Quando finalmente encontrou um lugar para ficar, porém, bem estreito,
mas suficiente para ela observar uma menina de cabelos loiros e cacheados, que
colocava umas taças de prata em uma bandeja.
— Você disse algo? — Outra voz surgiu atrás dela, Anala pode
ver agora outra menina de cabelos escuros se aproximar da outra. Incomodada com
o local, Anala resolveu mudar-se. Observou um espaço pouco maior por perto e
certificou-se que as duas outras meninas estavam discutindo por tempo
suficiente para ela se mudar. Andou abaixada, quase se rastejando, para embaixo de uma mesa, mas
acabou esbarrando em algo por causa do seu nervosismo.
— Ouviu isso? — Perguntou a garota dos cabelos escuros. Ela
deu alguns passos a frente enquanto Anala se xingava por pensamento.
— O que foi? Ela acordou? Foi isso? — Perguntou a garota de
cabelos cacheados, totalmente distraída com a situação.
— Não — Deu alguns passos a frente, indo em direção a mesa
em que Anala estava. A garota de cabelos azuis estava bastante nervosa, seu
coração batia forte – Eu acho que temos companhia — Disse a mesma empurrando a
mesa e revelando Anala.
— Acha mesmo que vai aguentar muito tempo aí? — Perguntava
enquanto lixava suas unhas. Estava rindo de toda a situação, embora fosse entediante ver apenas seus bichinhos voarem um campo de água, mas valia a pena
pelo pânico que Alpha sentia.
— Tempo suficiente — Disse blefando. A água fluía cada vez
menos e Alpha já não agüentava mais, sabia que a qualquer momento o campo de
proteção cairia e ela seria atacada por vários seres que cuspiriam brasas de
fogo em seu rosto. Só lhe restava rezar para que a situação melhorasse.
O rapaz levantou-se de sua cadeira e parou em frente ao
campo de proteção, que começou a se desfazer lentamente. Observava Alpha sofrer
e se alimentava daquilo, poderia ficar ali o dia todo vendo a situação se
repetir que só lhe dava mais poder.
— Vamos parando o show! — Disse uma voz que surgiu por trás
do loiro. Ele se virou e observou Anala sendo arrastada pelas duas garotas que
estavam no santuário.
— A algema de fogo é realmente necessária? — Anala perguntou
com raiva, suas mãos não estavam queimando literalmente, mas algo naquelas
algemas dava essa sensação.
— Focus sempre desesperado! Pare
de se aproveitar da garota — Disse a morena, com raiva da cena que via.
— Qual é, Trish, está divertido! — Disse rindo. Trish, incomodada com a situação, colocou suas mãos ao chão e
tudo começou a balançar como se estivesse acontecendo um terremoto naquele
momento.
— Está divertido pra você agora? — Perguntou ela. Certamente estava flertando com ele e vice-versa. Para Anala,
uma cena totalmente idiota.
— O que está acontecendo? — Anala
perguntou, cortando todo o clima. Mas não precisou de uma resposta em palavras,
pois logo viu os flâmines sumirem junto do campo de proteção feito por Alpha. A
fada desmaiou em seguida.
— O que vocês fizeram? — Perguntou Anala, preocupada.
— Focus fez você e sua amiga de
palhaças. Flâmines nem existem, são apenas mitos — Disse como se fosse a coisa
mais simples do mundo, deixando a cabeça de Anala mais perturbada ainda — Focus
é uma salamandra, um ser de fogo que emite calor de forma tão demasiada que
consegue causar ilusão em suas vítimas, fazendo-as verem tudo que ele quiser
ver.
— Oops — Disse o rapaz rindo.
Apenas levou um esbarro que Trish lhe deu. A menina foi até Alpha e a examinou — Ela está bem, só está fraca. Não deveria ter gastado toda sua força com ele –
Disse.
— Ok, tudo terminou em bolo,
podem me soltar agora? — Pediu Anala com ignorância, ainda tentando digerir toda a situação.
— Flânis. Irmã do Focus. Outra
salamandra. Não tem algema, garota! — Disse. A garota loira de cabelos cacheados sorriu, deixando Anala completamente brava.
— Bem, cachinhos dourados, eu
tenho algo bem real para você – Disse se preparando para atacá-la.
— Podemos iniciar uma briga ou
ver como ajudamos sua amiga, mas posso garantir que você não vai se dar muito
bem contra uma ilusionista, experiência própria — Disse a morena, carregando
Alpha em seus braços.
— Ok. Vamos fazer da sua forma — Cedeu.
Ouviu alguns chiados por trás de
sua cabeça, mas estava preocupada demais com Alpha para dar atenção. Quando
eles se intensificaram, pode finalmente perceber quem havia chegado para sua
surpresa. Dirigiu-se até as barras da caverna e viu a luz no fim de seu túnel,
em meio a tanta escuridão.
— Não imaginaria que um dia iria
dizer isto. Mas estou feliz por te ver! — Disse observando o rosto do elfo do
lado de fora das barras.
— Não achou que iria se livrar
tão rápido de mim, achou? — Ele disse com um sorriso sarcástico no rosto.
— O que você está fazendo aqui?
Achei que tinha ido embora, voltado pra casa! – Indagou.
— Depois eu explico, agora temos
que bolar um plano para tirar vocês daí – Disse preocupado.
— Viemos falar com as rainhas, mas tem um menino tão chato
quanto você nos mantendo prisioneiras aqui... — Parou por alguns segundos e
pensou consigo – Você é ao menos real?
— O quê? — Dioniso não entendeu nada.
— Estou cansada das suas brincadeiras, Focus, tenho coisa
melhor pra fazer nessa caverna... Medonha, escura e apertada! — E virou-se de
costas para cuidar de Alpha novamente. Dioniso continuou confuso, ouviu alguns
barulhos e resolveu esconder-se.
— Voltei! — Disse Trish, trazendo consigo uma cesta de
alimentos para as garotas. Ela apertou um botão e as grades se abriram. Ela
entrou na caverna e colocou no chão.
— Ela está melhor? — Disse se aproximando, estava
visivelmente preocupada com Alpha, embora não pudesse fazer muito para tirá-la
daquela situação precária.
— Ela acordou e desmaiou novamente, está muito fraca. Ela
tem usado sua magia durante toda a nossa viagem... E a briga com o Focus não
ajudou muito — Respondeu.
— Bem, já já é hora da rainha acordar, então ela vai
finalmente poder ajudá-la e... — Foi surpreendida repentinamente por uma
pancada na cabeça. Era Dioniso com um porrete de madeira que apareceu por trás
apunhalando-a.
— O que você fez? – Perguntou surpresa — Oh... Você é real — Estava mais surpresa ainda.
— Vamos, temos que dar o fora daqui — Disse puxando-a pelo
braço.
— Não, essa garota está nos ajudando — Respondeu com raiva –
Estava até você desmaiá-la.
— Mantendo vocês presas? — Indagou, já quase perdendo a
paciência. Anala assentiu e o elfo pegou Alpha no colo. Eles saíram da
caverna e apertaram o botão, aprisionando Trish lá dentro.
— Quem era ela afinal de contas? — Perguntou o elfo,
sussurrando.
— Uma fada da terra. Ela é ajudante da Fada Rainha. Ela e
mais uma dupla de salamandras vigiam o reino na parte do dia.
— Ah... Agora entendi o que você quis dizer com eu ser real
ou não — Disse ele.
— Enfim, qual a sua grande ideia para sairmos daqui? — Questionou.
— Tem uma passagem por ali — Disse apontando a direção — Podemos ir e depois encontrar outro caminho para a saída.
— Aonde vocês pensam que vão? — Disse uma voz grave atrás
deles. Os dois se viraram e viram uma mulher de cabelos escuros que estava penteado
como rabo de cavalo. Suas roupas eram negras com detalhes espessos, dando a
sensação de peso. Era como se fosse uma roupa feita de rochas, que visivelmente
seria difícil de ser carregada. Não para aquela mulher. Anala estava certa de
que aquela era a Fada Rainha da Terra e agora que a vira, não sairia dali sem respostas.
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